Castelo de S. Jorge
O presidente chinês Hu Jintao suspendeu a visita que tinha programada ao nosso país em 10 e 11 de Julho passados para regressar antecipadamente à China no seguimento dos acontecimentos na província de Xinjiang. Embora tenha delegado no Conselheiro de Estado Dai Bingguo a sua representação na cimeira dos G8, Hu preferiu reprogramar a visita a Portugal, mas fazê-la pessoalmente o que será um indicativo da relevância que a China dá às relações com o nosso país com o qual assinou uma parceria estratégica em 2005. Celebra-se este ano o 30º aniversário do estabelecimento de relações diplomáticas entre Portugal e a RPC e o 10º da transferência da administração de Macau.
Com Hu viajaria até Lisboa uma delegação de mais de 200 empresários chineses desejosos de alargarem as suas operações para a Europa – a proclamada estratégia going out – alguns deles começando, porque não, por Portugal. Surpreende-me a quase total ausência de notícias e a nenhuma discussão sobre este importante assunto na comunicação social portuguesa. Faz agora precisamente 20 anos que estudo a China, onde vivi, onde vou frequentemente e sobre a qual fiz a minha tese de doutoramento e é-me difícil compreender e aceitar o nosso desinteresse e até menosprezo por aquela que já é a terceira economia do mundo e, eu sei, ameaça tornar-se muito mais. Fruto de intenso trabalho negocial o ISCTE tem um DBA (Doctor of Business Administration) na China e os nossos mais de 30 doutorandos, muitos deles empresários importantes à nossa escala, perguntam-me frequentemente quais as possibilidades de cooperação com o nosso país. O que lhes hei-de responder?
Mas não é Hu Jintao o “turista da China” de que vos quero falar. É Tongyan que visitou Lisboa há duas semanas para um programa doutoral no ISCTE, embora “visitar” seja neste caso um verbo demasiado forte. Tongyan, uma executiva de Pequim, directora de marketing numa importante farmacêutica, começou por recusar todos os meus convites para visitar a nossa cidade argumentando muito que estudar, muito que fazer e não saía da rotina hotel, aulas, hotel. Ao quinto dia consegui convencê-la. E foi ali, na muralha do castelo, enquanto o dia se dissolvia na noite, olhando o azul do Tejo, os barcos ocasionais entre as margens, os telhados derramados sobre a colina, que Tongyan me disse de repente, como numa confissão: “Recomendaram-me que não perdesse muito tempo em Lisboa, que era uma cidade suja, envelhecida, pequena e desordenada, sem qualquer ponto de interesse”. Fiquei chocada. Quem? Precisamente um grupo de médicos chineses, mais de uma dezena, que no princípio de Junho aqui esteve para um congresso internacional. No regresso à China foi essa a mensagem que os médicos levaram da nossa cidade. E andam a espalhá-la.
Semelhante percepção deveria preocupar-nos pois a China será em breve um dos maiores mercados emissores de turistas do mundo. Em cinco anos o número mais do que duplicou: de 16,6 milhões em 2002 passaram para 40,9 milhões em 2007. Gastam em média 2.100 euros por pessoa e por viagem e, enquanto o número de chineses afluentes cresce, aumenta também o seu desejo de viajar estimulado pelo próprio governo através da liberalização e de incentivos como o aumento do número de dias de férias ou de países com estatuto de “destino turístico aprovado”. O turismo de negócios é também cada vez mais importante em resultado do forte crescimento económico do país e da crescente presença da China na economia mundial. Muitos, mais de 87% segundo revelou um inquérito recente, aproveitam para juntar o negócio ao lazer beneficiando com isso o país de destino.
Tongyan poderia ter sido um desses turistas. Tem um rendimento elevado, é curiosa e aventureira, conhece quase toda a Europa e é esta a primeira vez que vem a Portugal. Acha pena que o nosso país e a nossa cidade possam ter ganho uma má reputação e lembra que o turista chinês não é um turista qualquer. Gosta de viajar em pequenos grupos e de maximizar o valor da sua estada onde quer que seja. Programas compactos não são problema, é preciso visitar muito e receber muita informação. Noutros países que Tongyan já visitou os quartos de hotel têm chaleiras eléctricas para a preparação do chá e também folhetos com informação útil do ponto de vista do turista chinês sobre o que e quando fazer. Esses países pretendem encorajar e capacitar os visitantes chineses a darem os primeiros passos e esperam com entusiasmo a continuação das excursões.
Virgínia Trigo
ISCTE Business School
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